Jaqueline Moll e Natacha Costa dialogam sobre educação integral com educadores da Bahia

Centenas de educadores baianos participaram na tarde desta quinta-feira (1/7) do Diálogo Formativo e Certificação da Formação em Educação Integral, promovido pela Secretaria da Educação do Estado da Bahia por meio do Instituto Anísio Teixeira (IAT). A atividade integrou o Plano de Formação Continuada Territorial e foi transmitida pelo canal do IAT no Youtube, onde permanece disponível na íntegra.

A educadora Jaqueline Moll, maior referência brasileira no tema da Educação Integral, participou do encontro, ao lado da pesquisadora Natacha Costa, diretora-geral do Cidade Escola Aprendiz. Natacha é parceira do IAT na construção da tematização da Educação Integral no Plano de Formação Continuada. Durante o encontro, ela falou sobre Educação Integral no contexto das territorialidades. "É importante lembrar que o direito à educação no Brasil é tardio. Chega a partir da Constituição de 1988. E a gente vive um processo de universalização que se deu em grande medida a partir de lógicas mais padronizadas. A Educação Integral vai surgir pro entendimento de que a qualidade na educação está relacionada com a garantia das aprendizagens, mas também do desenvolvimento integral de cada estudante".

Para garantir essa indissociabilidade, Natacha lembrou que é fundamental olhar para os estudantes como sujeitos sociais, multidimensionais, reconhecidos nas suas comunidades e nos seus territórios. "Só a partir desse reconhecimento nós podemos construir um projeto educativo que seja pertinente e emancipatório. Eu posso olhar para o meu estudante como um sujeito onde eu vou depositar conhecimento. Ou posso olhar pro meu estudantes como um sujeito para quem eu quero criar condições para que se constitua autonomamente, como um agente da sua própria vida e da vida em sociedade. Um sujeito que não apenas reproduz o conhecimento, mas produz conhecimento".

A construção deste projeto emancipatório passa pela contextualização das práticas educativas e dos currículos, com a participação das famílias e das comunidades. "Precisamos diversificar as interações, trazer outros agentes, outras linguagens, outros recursos. O território é um espaço potencial educativo no sentido de que oferece um conjunto de interações que o espaço da escola não tem muitas vezes como oferecer. A escola deve baixar seus muros, ser escola e comunidade como um corpo integrado".

A aguardada fala de Jaqueline Moll trouxe a temática da materialização dos princípios da educação integral no projeto político-pedagógico (PPP) da escola. Numa perspectiva que reitera a educação como um direito constitucional, a educadora trouxe a importância de entender a educação como parte fundamental da vida, sobretudo neste momento que o país atravessa. “Falar de educação é falar de algo muito estrutural na vida das pessoas, é falar das possíveis portas de saída das situações de miséria e indignidade que ainda são muitas no nosso país.”

Jaqueline mostrou a importância de se vincular a escola ao que chamou de ecossistema, sendo este todos os aspectos com os quais se relaciona, especialmente no que tange aos direitos constitucionais, indissociáveis do direito à educação. “A escola faz parte de um ecossistema muito maior, o direito à educação só se materializa se está ligado aos outros direitos.” Na escola, afirma, é necessário tempo e espaços ampliados, além de condições dignas para que a relação com esse ecossistema possibilite trocas e partilhas que produzam novos sentidos.

CONFIRA COMO FOI A CERTIFICAÇÃO DA FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO INTEGRAL

Esta troca constante é apontada por Jaqueline como fundamental na construção do PPP de uma escola. “O PPP é um instrumento fundamental e só pode ter sentido se for resultado de diálogo e construção permanentes, que precisam considerar um contexto muito maior.”

Para atingir esse patamar, Jaqueline defende que é necessário que os educadores revisitem o sentido das suas próprias práticas pedagógicas. Para além dos resultados quantitativos, é necessário que os educadores reafirmem o compromisso com os direitos individuais e sociais de cada estudante. “Falar de PPP é falar de metas, mas nossa mente está tão voltada à esta questão burocrática que quando falamos em meta, a gente já vê números, as notas do IDEB. Tudo isso tem sua importância e seu lugar, mas tudo isso é consequência de outros processos. Este é um país que vem investindo muito na avaliação, mas parece que esqueceu que para ter resultado, precisa ter processo e processo de médio e longo prazo.”

Defendendo a desburocratização da educação pública, afirma que a Educação Integral leva esse nome apenas para diferenciá-la de um modelo que não garante as autonomias pedagógica, administrativa e financeira que a escola precisa e que figura na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). “Falar em Educação Integral não é falar de outra coisa senão falar da vida, de outro modo de viver e pensar a escola. Um dos inimigos do projeto de educação pública é essa profunda burocratização. Quando a gente não consegue explicar para os pais dos nossos estudantes, com pouca escolaridade, muitos analfabetos, o que a gente está fazendo na escola, o que a gente deseja para a escola, a gente tem que repensar o que está fazendo.”

Reverenciando os passos dados por educadores como Paulo Freire e Anísio Teixeira, que segundo ela deveria ser intitulado patrono da escola pública brasileira, a educadora afirma: “Vamos inventar outras coisas, mas é preciso que esse caminho seja reconhecido.”

E um dos caminhos legítimos para a construção de uma nova forma não apenas de pensar, mas de fazer educação, é o trabalho da formação continuada: “Sigo em formação permanente todos os dias da minha vida. A própria leitura da realidade parte de critérios para pensar um mundo em que todos caibam.”

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